domingo, 27 de outubro de 2013

E pra onde foi Amarildo?

    Eu desobedeci a máxima "não leia os comentários". E vi uma enxurrada de dizeres que me deixaram de cabelo em pé. E o pior é que isto reflete a mentalidade da população brasileira - o gigante que acordou. E haja preconceito pra constituir a carne desse gigante, viu?

    A matéria, sobre as últimas horas de Amarildo, não tinha nada de demais, era só um infográfico dizendo sobre o que foi concluído com inquéritos (http://noticias.uol.com.br/infograficos/2013/10/25/entenda-o-caso-amarildo.htm), de maneira simples. Mas aí... aí chegam os comentários. Coisas como "Fala sério, maior cara de n?óia, soltador de rojão para avisar tra/fican/tes que a policia estava sempre chegando.... Mais um pouco terá ONG lá em cima pró Santo Amarildo" ou "O Amarildo foi morto, os responsaveis tem que ser punidos e ponto. Mas porque todos estao empenhados em transformar este Sr em Martir? Sejamos racionais, nao e correto fazer justica com as proprias maos, mas cara que morre como oAmarildo, executado, no minimo tava no meio de toda a sujeira", ou "sou um civil comum, e mais uma vez vejo o sensacionalismo burro de uma imprensa mal formada e medíocre, deixa polícia trabalhar.". E eu poderia continuar transcrevendo os comentários até amanhã, porque a cada minuto chega mais uma dose de veneno.

    Eu me pergunto em que mundo eu vivo. Como as pessoas conseguem ser tão preconceituosas e estúpidas. Como elas pré-julgam as outras, julgam e condenam. O cara mora na favela, ele é bandido e sempre será; se fosse cidadão de bem ele se esforçaria, estudaria mais e teria um trabalho melhor. Acho bem válido compartilhar uma ideia (porque a imagem eu não achei) sobre um rapaz, canavieiro, que nunca pôde ir à escola, já que a mais próxima ficava a mais de 15km de onde morava, e os professores, quando presentes, não tinham materiais ou mesmo conhecimento/preparo pra ensinar, e o rapaz cresceu e continuou analfabeto, mas se mata de trabalhar, cortando cana. Paralelo a este cenário, o filho do dono da usina canavieira (onde o rapaz da sentença anterior trabalha), sempre teve a melhor educação, e herdou o império usineiro do pai, tendo que trabalhar pouco (pra não dizer quase nada) para chegar aí.
    Há uma grande dificuldade, em quem tem tudo (ou acha que tem tudo, porque lhes falta um senso de social muito grande, bem como muita educação e cultura - mas sobra dinheiro e lugar vago no cérebro, onde trabalham seus conceitos dogmáticos), de analisar o meio social dos outros, e perceber que nem todos tem a mesma oportunidade (caso ali de cima, do canavieiro e do usineiro). Falta a capacidade de enxergar o mundo como o é, e fazem questão de não entender isso, para poder despejar essa eloquência na fala, de como, com muito trabalho, conseguiu juntar dinheiro e comprar casa, criar filho, etc, etc, etc. Acha que se outra pessoa que pelo acaso teve ainda menos chance, não conseguiu "vencer na vida", essa pessoa foi folgada.

   Mas o mais grave é o que veio a seguir. Dizer que Amarildo tava no meio da sujeira - sem conhecer o senhor. Já lançar a justificativa de que só foi pego porque merecia, porque era bandido sim. E depois que a imprensa é medíocre por mostrar tanto do mesmo caso, "que tem muita coisa acontecendo no país, por que mostrar só esse caso? Ele era só mais um!". Bacana, bacana - o engraçado é que a mesma lógica não se aplica quando um médico, um classe média é assaltado, baleado, morto ou w/e, né? Pai de família morre, ele não merecia, tem que passar na TV - e o sensacionalismo se torna válido.
    CARA, isso tá errado! Primeiro que o caso não é pelo fato do Amarildo ter morrido. Ele não foi o primeiro. Ele não será o último. Mas ele é um símbolo! Se você acha que as coisas estão erradas, ao invés de condenar o Amarildo, lute por uma sociedade mais justa! Entenda que ele é uma bandeira levantada para representar milhares de 'moleques' que são abordados pela PM e apanham, diariamente! Que ele representa as moças que são agredidas sexualmente (não um estupro consolidado, mas se um policial diz que uma mulher é gostosa, em exercício da função isso é abuso de autoridade e é SIM um estupro, agravado, porque o PM é a segurança da população, não quem deve causar a preocupação!), dos pais e mães de família que, ao voltarem do serviço, são chamados de vagabundos, tomam revista violenta. O Amarildo é sim um só caso, mas ele é a representatividade do todo!

   Daí você me diz: mas não adianta fazer nada, nenhuma luta vai adiantar, nada nunca vai mudar. Ah, é? Por que você não se mata, então, já que está descontente com o mundo e acha que não vai mudar nada, mesmo? Já se estiver com vontade de deixar o mundo um lugar melhor, tem uma grande mudança que pode fazer: mude a si, como pessoa. Antes de condenar alguém, veja a situação da pessoa. E principalmente - abandone os preconceitos. Eles só servem pra prejudicar a dinâmica social.

(primeiro texto onde testo a escrita sem usar gênero - ou tentando =P)

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Do ingresso da PM na Unicamp

"Sem vestibular, não"
 -Silva, J.G.C.

    Eu andava no centro de Campinas, meados de 2008, lá pelas 17h, era verão e o dia estava claro. Uma viatura passou, desceram 4 policiais militares, já apontando a arma e "bota a mão na cabeça, dá uma abaixadinha, vai ajoelhando gostoso, e começa a oraçãozinha"; e enquanto cutucava o revólver na minha cabeça, sussurrava: "será que meu dedo vai escorregar?". Isso porque tenho carinha de burguês, imagina o que fazem com a galera de periferia.
    Daí a Unicamp quer abrir as portas pra PM. Alguns dizem: acabou a farra dos maconheiros, Unicamp é lugar de estudo; quem não deve, não teme, etc. *bocejos*
E o Amarildo, o que é mesmo que ele devia?
     E tem gente que não compreende a arma repressora do governo que é essa instituição.
E esse professor? O que ele deve, que tá tomando borrachada da PM? É, PROFESSOR. Quem cuida da educação. LUTANDO por seus direitos foi REPRIMIDO.
     E será que ajuda? Vamos ver como a entrada da PM na USP modificou o cenário: http://www.jornaldocampus.usp.br/index.php/2011/11/dados-da-pm-sobre-queda-na-criminalidade-sao-inconclusivos/
Daí a gente analisa os abusos, a truculência policial e as muitas situações de flagrantes forjados por PMs por todo o país. E agora me diz: Se a PM presente na universidade não reduz a criminalidade, POR QUE RAIOS há necessidade da PM?
    Alguns alunos que não tem "cara de universitário", que não vestem o "uniforme" com blusa de marca, que não usam mochila pequena, porque tem um carro pra carregar o material, mora numa república às redondezas das principais portarias do campus... Essas pessoas, que estão na Unicamp pra estudar, estarão sujeitas à truculência policial, afinal de contas, quem não se lembra?:




    A entrada da Polícia Militar, no campus, é uma afronta à liberdade acadêmica. A universidade tem, historicamente, um posicionamento de vanguarda, onde boa parte das ideias não são primariamente aceitas pela sociedade, transmitindo-se conceitos posteriormente, depois de adaptação.
    A presença da PM tem um caráter milicioso, principalmente em locais como a periferia, ambiente "abandonado" pelo Estado, e os moradores dependem do assistencialismo de traficantes (muitas vezes de mãozinhas dadas com deputados por aí...), e a PM faz um serviço de "segurança privada", empoderando-se e quebrando leis para "manter a ordem". Não é este tipo de "ordem" que precisamos na universidade. Não é de PMs que precisamos lá dentro, para que aconteçam coisas DESTE gênero, onde a ironia extrapola o bom senso e o ridículo.
    Os PMs são treinados para agirem de maneira truculenta, e eu não quero que muitos amigos, que nem sempre tem carinha de boy/paty sejam abordados. Eu fiquei traumatizado com uma das abordagens, e isso porque não cheguei a sofrer nenhuma agressão física. Mas amigos já tomaram porrada. E nem sempre foi pouca coisa. E foram perseguidos pela polícia.
    A pergunta que fica é: se nós somos o povo, e estamos lutando pela nossa liberdade, sem desrespeitar nenhuma lei... A PM tá defendendo a quem? Não passam dos cães do governo.
  
    Pecamos
    Pecamos sim, ao não fazer com que a Unicamp seja uma universidade pública. Há um total descaso com o terceiro pé de sustentação da universidade. Pesquisa e ensino são supervalorizados, e a Unicamp forma tecnicistas de altíssima qualidade, fornecendo mais e mais insumos pra sustentar o sistema. E a parte em que a universidade tange à sociedade, por meio da extensão? Onde fica?
    As pessoas só depredam àquilo que não lhes importa, ou não lhes pertence. Como eu disse em postagem anterior, não se vê hospitais ou locais que prestam assistência à população sendo depredado. O que falta, na universidade, é essa proximidade com o povo. E sem o nojinho de ter contato com o povo, como eu vejo muita gente por aí, reclamando que "zé povinho/funkeiro/rapper", entre outros, são perigosos, são marginais. São marginais sim. São marginalizados por você, que não quer conviver no mesmo ambiente. Isso é marginalização, é por de lado alguém! Os alunos precisam lutar pela propagação da Universidade para o povo, só assim, a longo prazo, teremos o retorno e o fim da violência no campus.


    A entrada da PM representa a vontade do reitor de ter às palavras de ordem e repreensão. Além da tirada de corpo da Unicamp, em relação às festas e a falta de comprometimento da gestão da universidade em relação a toda essa criminalidade crescente na região.
    Para complementar, depois do petit aí em cima, sugiro que leiam os textos do link a seguir, que refletem meu pensar:
http://mariliamoscou.com.br/blog/?p=3020

Beijos de luz. Pra quem é contra a entrada da PM.
Pra quem é favorável, espero que seja abordadx pelo menos uma vez, com toda a truculência que eu fui, pq alguns amigos sofreram muito mais, mas daí já é pesado, só a minha abordagem já basta, pra vocês.